Claros escuros da Lusa
A celeuma levantada por uma notícia da Lusa sobre a composição de uma comissão parlamentar está a passar ao lado da questão essencial.
É certo que a qualificação racista da deputada do PS é ofensiva e inadmissível, mas todas os comentários, justificações e pedidos de desculpa abordam o incidente exclusivamente do ponto de vista racial, independentemente da consideração de ter sido deliberado ou acidental, como alega o autor da notícia.
Mas isso não esgota a discussão. Importa saber como foi possível distribuir no serviço da agência estatal de notícias uma expressão daquela natureza. (João Alferes Gonçalves)
Espero que o inquérito anunciado pela direcção de informação da Lusa esclareça as circunstâncias em que isso aconteceu e que, como se disse, sejam retiradas as “devidas consequências”.
Aparentemente, a explicação está no facto de não haver uma edição responsável de todas as notícias, podendo ser colocadas em linha directamente pelos jornalistas, sem supervisão editorial.
Com elevada frequência, a Lusa distribui notícias mal redigidas, com erros de português, más traduções ou erros de técnica jornalística. Na maior parte dos casos, trata-se de notícias que não foram adequadamente editadas.
E não se diga que não são erros tão graves como o que agora se discute. Alguns foram igualmente graves. Apenas não feriram susceptibilidades.
Um erro da Lusa é duplamente danoso. Primeiro em termos absolutos, depois por, em geral, ser acriticamente reproduzido em muitos media. Como o foi no caso em apreço.
Sei como o serviço da Lusa é importante no ambiente mediático português. Sei que sem a Lusa muitos assuntos deixariam de ser visíveis e que outros poderiam ter um tratamento enviesado. Mas isso não desculpa os erros. Pelo contrário, aumenta a responsabilidade da Lusa.
O leque de problemas que afecta a Lusa, do orçamento à organização do trabalho, exige uma análise séria e decisões corajosas. É tempo de se fazer uma auditoria independente ao funcionamento da agência, que estabeleça novas metas e novos métodos.
Sem isso, outras celeumas se perfilam no horizonte e a cidadania continuará… ilusa.
João Alferes Gonçalves
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